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Arquitetos: Contaminar Arquitectos
- Ano: 2019
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Fotografias:Fernando Guerra | FG+SG
Descrição enviada pela equipe de projeto. O projeto foi desenvolvido no Povo, nos arredores de Leiria, Portugal. Uma zona onde os elementos rochosos são predominantes na paisagem, terras calcárias, topografias irregulares e contrastes acentuados. Este contexto geológico único proporcionou de imediato aos arquitectos um ponto de partida conceptual que é ao mesmo tempo onírico e romântico sem perder a ligação ao que é a realidade física e intrínseca deste local. Surge assim a ideia de uma caverna ou gruta, um refúgio austero entalhado e denticulado que é humanizado pelos seus ocupantes. Esta premissa é um olhar e uma homenagem aos primórdios da humanidade e da sua relação simbiótica com o ambiente que habita, contém em si o paradoxo da pedra perene e agreste que se torna um refúgio natural e maternal.
Por entre uma paisagem diversa, que se caracteriza por ser aparente e empiricamente inóspita, surge num acto de coragem volumétrica uma gruta construída e idealizada inteiramente em betão. Esta moradia unifamiliar balança cuidadosamente o jogo entre o vislumbramento do pinhal envolvente e a privacidade dos seus moradores. O projecto é marcado por uma multiplicidade de circuitos que ordenam os espaços com harmonia e simplicidade através de um elemento fulcral: a luz, que interage rompendo os elementos primitivos e as linhas sinuosas com subtileza.
O programa para esta moradia T3 foi divido pelos dois pisos e meio da habitação que através de um pátio distribui, ordena e conecta tanto os espaços interiores como os percursos exteriores. O acesso principal envolve os pinhais existentes e enquadra a vegetação entre os seus muros de ângulos acentuados. Esta estrutura na entrada recorre a um pé direito de proporções generosas para se conectar à sala e permitir a visualização da paisagem norte/poente mas também proporcionar a entrada de luz e calor do pátio que está no sentido sul e que é adaptado à irregularidade do terreno intocado. Da sala acede-se a uma varanda também em betão, um espaço destinado à contemplação dos entardeceres.
Numa cota distinta nasce um acesso exterior que encaminha ao escritório, espaço que se distingue pela ampla abertura envidraçada. Esta divisão encontra-se meio piso acima e conduz também à cobertura que proporciona uma vista de 360 graus da envolvente. Daqui é possível circular através de uma outra rampa ligada ao pátio e a um acesso secundário privativo que permite aos visitantes aceder diretamente ao escritório sem invadir as restantes divisões da moradia.
A casa Povo respeita e adapta o corte do terreno em relação ao seu traçado original, diferencia-se de forma subtil e delicada mantendo uma relação harmoniosa entre o público e o privado. A distribuição espacial e a volumetria dos quartos acompanha e reflete a topografia de cotas distintas. A rampa de elevação suave permite o acesso directo ao pátio, à sala e à cozinha, ligando todos os elementos tanto pelo interior como pelo exterior.
A criação de um jardim interno com rampas confere ao projecto a integração necessária, além da expressão sensorial quase lúdica utilizada pelas crianças com a interligação do jardim até à cobertura, permitindo uma permeabilidade da gruta com os enquadramentos que seccionam os espaços construídos com o jardim.
Debaixo do escritório, a um meio piso da sala encontra-se a área de serviço (lavandaria) com ligação ao exterior. A solução adoptada possibilita a entrada de luz e ventilação natural nos rasgos criados entre cada patamar da escada que interliga a varanda da sala ao escritório no piso superior.
A necessidade de conectar os espaços cria uma forte narrativa de distribuição espacial e cumpre a sua função ao mesmo tempo que orienta o ritmo e composição da forma do objeto arquitetónico. O betão aparente com cofragem em ripado de madeira é o elemento construtivo predominante nas fachadas e remonta a uma densidade que segue uma volumetria monolítica e cria a proteção que a inspira: uma gruta humanizada.